Se correr, o bicho pega, por Bruno Peron

Material escolar em xeque?
Arquivo/Google

Tenho paixão pelo Brasil. Vejo meu país como um território prometedor. Mas a prova de que seu desafio maior é educativo está na ironia das regras novas para a comercialização de materiais escolares a partir de março de 2015. Materiais escolares somente poderão ser vendidos com um selo do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO), que tem ligação com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Não é por acaso que a Nintendo (empresa japonesa que fabrica jogos eletrônicos) pulou fora do Brasil com sua declaração sucinta de que sua despedida decorre de dificuldades com o modelo de negócios no Brasil. Entendo que ou você é grande demais para sobreviver (evito o uso aqui do verbo progredir) no Brasil, ou será limitadamente pequeno a ponto de ter que evadir fiscalizações e conviver com irregularidades. De qualquer maneira, ouvimos que “se ficar, o bicho come; se correr, o bicho pega”.

Pergunto: que modelo de Brasil queremos? Pense bem nesta pergunta, leitor.

Não nos iludamos. O Brasil atravessa um período grave de desindustrialização, desincentivo a investimentos e bloqueio de negócios. Existe um controle burocrático (o que, como e com que material empresas têm que produzir seus produtos para colocá-los no mercado brasileiro) e uma redução de competição (com retraída de emprego e aumento de preços). O caso dos materiais escolares deixa claro, pelo menos para mim, que há uma guerra tramada e velada aos produtos asiáticos, sobretudo chineses.

Não me oponho à fiscalização e à exigência de qualidade dos produtos, mas acho que essa tarefa está mais nas mãos dos consumidores que do Estado. É pertinente que materiais escolares passem por testes rigorosos em sua composição biológica, mecânica, química, toxicológica e de outros aspectos para garantir segurança aos consumidores. Porém, poucos fabricantes terão condições de acompanhar todas as exigências, o que resultará em bloqueio de empresas de pequeno porte e de produtos asiáticos que incentivariam a competitividade de produtos de indústria brasileira. Novamente, o Estado brasileiro tem preferido proteger a incentivar. Uma decisão equivocada.

Tudo que o Estado brasileiro faz é proteger empresas grandes do setor em vez de encorajar empreendedores pequenos e médios. A brandura cínica do INMETRO é tanta que, porque seus burocratas reconhecem que a maioria dos proprietários de papelarias são empresários familiares e pequenos, a fiscalização do INMETRO deve ter inicialmente um caráter educativo e não punitivo. O INMETRO é mais descarado ainda quando convida consumidores a fazer denúncias à sua Ouvidoria e, portanto, sugere que está do lado dos consumidores. Ele está, na verdade, contra os consumidores porque haverá variedade menor de produtos comercializados nas estantes de papelarias, aumento de preços e desestímulo ao empreendedorismo no setor.

Por mais notáveis que sejam os descaminhos no Brasil, nossa responsabilidade por eles é apenas um pedacinho da pizza, mas que ainda nos reserva algum paladar. As razões de desgovernos continuam culturais e educativas, já que testemunhamos a informalidade nas práticas comerciais (vendas sem nota fiscal, mercado negro, etc.), a palavra final das certificações (como a de materiais escolares) e o custo alto das carreiras estatais (sonho de estabilidade de muitos jovens recém-formados) num país que tem sido deixado para trás por países como Chile e Coreia do Sul.

Observo que o Estado brasileiro sob regime do Partido dos Trabalhadores tem conduzido o Brasil na direção de redução das liberdades e dirigismo estatal (censuras, fiscalizações, aumento desnecessário do funcionalismo público, etc.). Suas políticas são extremamente cavilosas e perniciosas do ponto de vista do empreendedorismo, do progresso e da realização pessoal. Mas é claro que não é somente culpa dos políticos, mas de um segmento da população que descrê em sua capacidade de ultrapassar a meia-cidadania.

Chegou o momento, leitor, de conhecermos nossos deveres no Brasil.

Basta de postergarmos nossos desejos de prosperidade e realização.

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O autor Bruno Peron  é escritor e analista de Relações Internacionais, professor de idiomas (português e Inglês) e Voluntário de Organizações SEM Nadadeiras lucrativos.