O que estamos fazendo com as nossas crianças?, por Júlio Gomes

Debate sobre o cuidar na infância
Arquivo JBO

Causa-me profunda preocupação o que vejo nos dias de hoje, relacionado à forma como criamos e como estão, em função de tal criação, se conduzindo nossas crianças.

Vamos deixar que os fatos falem. Domingo, dia 23/11/2014, estive em um local próximo à Ilhéus, Bahia, onde há um rio em que as pessoas se banham. Ao lá chegar, encontrei cerca de 30 crianças com idades entre seis a doze anos, sem nenhum adulto por perto para olhá-las. Sendo da comunidade local, brincavam na água de sunga ou biquíni.

Observei que um menino com oito a dez anos se aproximou de uma menina de mesma idade, e nas águas escuras do rio começou a “pegá-la”, diga-se, sem qualquer reação contrária por parte da menina. Havia bares por perto, e o fundo musical era algo como mete, quica, chupa e coisas do gênero, a tocar por horas seguidas. Como tudo era consensual, me limitei a observar.

No mesmo dia, à tarde, fui para uma praia situada na cidade de Ilhéus, em companhia de familiares. Foi quando me surpreendi novamente ao ver passar uma menina de uns oito ou nove anos com um biquíni vermelho, adulto, com a parte traseira de completamente “enfiada” entre os glúteos, copiando o padrão de uso das mulheres ali presentes.

Fiquei me perguntando: onde estaria a mãe, que não via tal coisa? Passado pouco tempo, uma mulher – não sei se mãe da menina – surgiu para banhá-la no chuveiro de praia, afim de irem embora. Para minha surpresa, nem uma palavra, nem um olhar, nem uma reprimenda ou simples orientação quanto à atitude da criança. Para aquela mulher tratava-se da coisa mais normal do mundo.

Talvez aos 49 anos eu seja alguém extremamente careta, um superconservador sem lugar no mundo de hoje. Mas o fato é que não consigo entender nem aceitar como em um Brasil com tantas violências sexuais contra crianças, veiculadas diariamente pela mídia com base em boletins de ocorrência e em estatísticas policiais, as mães e os familiares não as orientam, não as moderam, não as protegem!

Não senhor, desta vez não venha culpar aos políticos. Tampouco aos professores, ou mesmo ao “sistema”. Absolutamente, não!

A educação e proteção de cada criança cabe à sua família, e somos nós, o povo, os pais, as mães, as famílias, que estamos permitindo que tais coisas aconteçam. Juntamente com as novelas e com as músicas, enfiamos sexo o tempo todo pela garganta denossas crianças - e sexo da pior qualidade possível, da mais baixa sensualidade -totalmente desprovido de amor ou de qualquer outro sentimento afetivo.

A impressão que tenho é que somos irracionais fabricando mais e mais irracionalidade. O que reclamar ou cobrar destas crianças? Como esperar que elas venham a ter limites? Que caminhos uma sexualidade tão precoce trilhará? Como evitar uma gravidez ou uma DST (doença sexualmente transmissível) ainda na primeira adolescência? Como esperar que estas crianças pensem em amor, se só lhes ensinamos sexo?

Estamos fazendo algo da maior gravidade contra nossas próprias crianças, que não têm meios para se defender dos ataques externos de uma sexualidade criminosamente precoce, sem limites, que só tenderá a agudizar-se mediante a descoberta do corpo e do desejo. Uma descoberta que deveria realizar-se no momento adequado – na adolescência - e não por meio de tão irresponsável antecipação.

Que Deus olhe pelas crianças do Brasil. E que tenha misericórdia de nós, pelo grave crime que estamos cometendo contra elas.

O autor Julio Cezar de Oliveira Gomes é graduado em História e em Direito pela UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz. e-mail: juliogomesartigos@gmail.com