De novo, a implicância com o sino!

Walmir Rosário
Divulgação/Waldyr Giomes

Deve ser o sinal dos tempos, como costumam dizer os antigos. Não sei se é apenas uma simples implicância ou a chamada intolerância (até religiosa) muito comum nos tempos de hoje. O certo, que, pela segunda vez em cerca de quatro anos a sonoridade dos sinos das igrejas católicas de Itabuna volta a ser questionada.

O alvo anterior foi a Catedral de São José, agora, a reclamação é contra a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, no bairro do mesmo nome. Na catedral, contra o sino tradicional, fundido em bronze, que dá uma sonoridade ímpar a cada badalada. Na Igreja de Nossa Senhora da Conceição, o sino é uma versão moderna, concebida na mais alta tecnologia digital, integrada por duas “bocas” de alto-falante colocados na torre do templo.

São José e Nossa Senhora sempre foram perseguidos: naquele tempo por serem os pais de Jesus Cristo, nomeado o Rei dos Judeus, levando o temor aos romanos invasores e aos judeus palacianos. Terminou sendo julgado e condenado a morrer crucificado. Se esperavam os dirigentes de então que calariam sua voz, enganaram-se, ela tinha sido semeada aos quatro ventos.

Se me recordo bem, as reclamações contra o badalar dos sinos, o tradicional na Catedral e sua versão informatizada, na Igreja da Conceição, não partiu da comunidade. Tanto lá como cá, foram apenas duas pessoas as incomodadas com repicar dos sinos. Os protestos vieram apenas e tão somente de duas vozes, uma de cada vez, sem representatividade ou ressonância.

O silêncio dos sinos da Catedral foi denunciado aqui mesmo no www.ciadanoticia.com.br e causou muita celeuma, inclusive com esse simples blogueiro sendo vítima de sermões negativos nas Santas Missas. Mas nada que atrapalhasse a comunicação entre esse pecador confesso e Deus, além dos santos e anjos protetores. E os sinos da Catedral de São José voltaram, garbosamente a dobrar.

Já o reclamo que tenta calar a sonoridade da versão moderna dos sinos da Igreja de Nossa Senhora da Conceição tomei conhecimento num programa jornalístico de um canal de TV. Ouvida, a maioria da comunidade se manifestou favorável à tradição secular, incorporada ao cotidiano daquele bairro. Como diz o ditado: uma só andorinha não faz verão.

De minha parte, que tenho na Igreja de Nossa Senhora da Conceição uma forte referência religiosa, não consigo conceber o motivo desta contestação. É o sino quem através dos anos serve para alertar aos fiéis o horário da Santa Missa e outras cerimônias religiosas e, inclusive o horário. Em Minas Gerais, os sinos se firmaram na tradição e os sineiros e tocadores se especializaram em fabricar e fazê-los dobrar em cânticos e harmonias diversas, apropriadas para cada evento.

Mesmo longe, posso dar o testemunho de quem, ainda adolescente, ajudou a construir aquele templo, erguido com a liderança de missionários do naipe dos frades capuchinhos Justo, Apolônio e Isaías. Somente a título de lembrança, os sinos – os de bronze – foram adquiridos com campanhas realizadas e que contou com o apoio de toda a comunidade.

Ainda quando residia em Itabuna, assistia, às terças-feiras, ao lado do colega José Augusto Ferreira Filho, a Missa em louvor a Santo Antônio na Igreja de Nossa Senhora da Conceição. E nossas referências eram o tocar dos sinos, pois como chegávamos mais cedo, ficávamos no bate-papo com os amigos, até que o Frei Calazans nos convocava para a missa.

Aos mais novos e desavisados, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição é a maior referência religiosa, urbanística, histórica, sociológica e antropológica do bairro. Foi a sua construção e implantação, responsável pelo convívio social, a educação e a elevação da autoestima daquela comunidade conhecida pelo nome pejorativo de Abissínia e que passou a ser conhecida por bairro da Conceição.

Apesar de àquela época os tempos serem outros, quando prevalecia a força bruta, a convivência em relação à diferença de credos eram por demais respeitadas. Os católicos não reclamavam dos louvores da Igreja Batista Teosópolis e da Igreja Adventista, muito menos ao contrário. A convivência era perfeita entre os pastores Apolônio e Isaías e os três frades capuchinhos. 

Não sei qual a opinião da autora do protesto contra os sinos em relação aos carros de som que fazem publicidade e dos chamados paredões, nocivos contra a saúde do corpo, ao contrário do dobrar dos sinos. Como um pastor deve cuidar de suas ovelhas, Frei Calazans, de pronto, já decidiu baixar o volume dos sinos digitais, mantendo as tradições religiosa e comunitária. O dobrar dos sinos representa a “voz de Deus”, cuja percepção transporta a alma para além das fronteiras do mundo terreno.

O autor Walmir Rosário é jornalista e um amante do som dos sinos