Índios voltam a falar em conflitos e dizem que ´a pior decisão é não decidir´

Índios dizem que não suportam mais esperar
Arquivo JBO/MaurícioMaron

O litoral da invasão é um barril de pólvora. Não temos mais tempo. Não dá para esperar. Se o governo não demarcar nossas terras, nós mesmos vamos demarcar. O governo diz que quer evitar o conflito, quando na verdade só o faz aumentar! E se não resolver vai correr muito sangue. Só do povo Tupinambá foram 21 parentes assassinados nos últimos anos. Não vamos ter medo. O governo pisa nos povos indígenas. O governo está levando as coisas na brincadeira”.

Esses desabafos indignados refletem o clima em que se deu o debate das 80 lideranças indígenas de quatro povos do sul, extremo sul e nordeste da Bahia. Na última sexta-feira (21), no 11º andar, num confortável auditório, na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Brasília, o clima esquentou. As lideranças cobraram duramente respostas efetivas dos representantes do Ministério da Justiça, da Secretariada Geral da Presidência da República, da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Incra.

As lideranças manifestaram o que consideram uma profunda desconfiança e descrença nas atitudes, omissões e ações ineficazes do governo com relação à gravíssima situação de conflito e tensões que se espalham na maioria das Terras Indígenas na Bahia.

“Nos sentimos traídos.  Já são 12 anos de governo do PT, que se diz o partido dos trabalhadores, mas tem compromisso com os ruralistas, o agronegócio. Não cumpriu suas promessas com relação aos nossos direitos. Votamos no Lula que prometeu demarcar todas as terras indígenas e quase nada fez. Apoiamos Dilma, essa nem sequer mencionou em seu projeto de governo a questão indígena. Quero deixar claro que isso muito nos entristece, mas não nos desanima, porque já resistimos 514 anos e vamos continuar fortalecidos por  Nhamisu, Siratã, Tupã”.

As respostas dadas pelos representantes dos órgãos do governo foram questionadas por serem, na opinião dos índios, evasivas e sem concretude, numa atitude velada de quem não quer resolver os problemas.  “Mais 30 dias, nos pedem cada vez mais prazos. A cada vinda a Brasília, e já foram inúmeras, obtemos a mesma resposta. Nos deem mais tempo. Tempo já não temos mais”, afirmou energicamente Aruã Pataxó.  

A questão vital e crucialde acordo com as lideranças, é a total paralisação da regularização das terras indígenas e as consequentes violências que decorrem desse fato. O representante Tupinambá questionou energicamente o ministro da Justiça por estar se negando a assinar a Portaria Declaratória da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Informou aos embasbacados representantes de órgãos do governo que eles estão fazendo a sua parte, tendo constituído um fórum de diálogo do qual os caciques estão participando, juntamente com os produtores rurais. Todos pedem e esperam desesperadamente uma decisão e um posicionamento do ministro da Justiça. Ou seja, questionam duramente a postura de omissão do governo federal.       

O representante do Ministério da Justiça reafirmou que a tábua de salvação, são as “mesas de negociação”. 

A pior decisão é não decidirDiante da informação de que o ministro está cauteloso em assinar Portarias Declaratórias, pois estas poderiam logo ser judicializadas e que isso geraria ainda mais violência, o secretário do Cimi questionou essa atitude política do ministro: “Divergimos dessa leitura do ministro, pois todas as informações que temos, junto com as comunidades indígenas, sustentam exatamente o contrário: a não demarcação é que gera e agrava sempre mais os conflitos. E diante da judicialização estas acontecerão em qualquer hipótese”.

“O governo pisa nos povos indígenas. Não fala a verdade... Quando esperávamos que a cobra iria desenrolar, ela enrolou mais ainda”, exclamou uma das lideranças. Diante da “agenda” evasiva e insatisfatória proposta pelos representantes do governo, decidiram exigir um compromisso por escrito e assinado por todos, para que tivessem algo em mãos para cobrar na próxima vinda a Brasília.