Irmandade oculta, omissa ou conivente?, por José Lourenço

 

José Lourenço Silva

Os dirigentes da Santa Casa de Misericórdia de Ilhéus precisam rapidamente esclarecer à sociedade quem são mesmo “os profissionais médicos de Ilhéus e de outras cidades circunvizinhas” que irão assumir a terceirização da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital São José, conforme informaram numa carta-resposta (leia clicando aqui) às minhas críticas enviada aos jornais, sites e blogs desta cidade (leia clicando aqui). Afinal, um serviço tão importante e essencial como este necessita funcionar de forma transparente, em especial numa instituição que tem por finalidade dos seus estatutos a filantropia.

Na mesma oportunidade, também seria de bom alvitre a direção tornar público a que pé ficou a responsabilidade de cada um nesta privatização. Sim, privatização. Ou você, caro leitor, acha que ao assumir um setor de um custo tão alto, um grupo de médicos empresários não vá pensar em faturamento?

Na carta em que tentam responder a alguns dos questionamentos que fiz no artigo anterior, os dirigentes da Santa Casa afirmam que a tarefa de tocar a UTI foi oferecida aos médicos que já atuavam naquele setor vital da instituição. Só “esqueceram” de informar que, para chegar a este grupo que agora irá assumi-la, eles usaram de dois pesos e duas medidas.

Aos antigos, a proposta era de que eles arcassem com todas as despesas, com a direção da Santa Casa continuando a controlar a receita. Para os novos investidores, uma proposta bem diferente. Talvez, lucrativa, para alguns ou alguém. E preocupante para a cidade: o Hospital São José seguiria arcando com o salário dos 32 funcionários do setor durante um ano, mais um ano de carência, sem repasses para o hospital.

A reforma que também estaria sob a responsabilidade dos investidores, acreditem, foi feita. No entanto, longe de ter custo para os novos responsáveis. A obra saiu pelas mãos de três servidores do próprio hospital.

Ademais, há um outro procedimento que merece a atenção dos ilheenses.

Nos últimos anos, equipamentos como respiradores e monitores, ofertados pelo governo do estado (Paulo Souto e Jaques Wagner), adquiridos, portanto, com recursos públicos, estarão sendo entregues à iniciativa privada, que vai tocar o negócio, obviamente que, visando lucro. É ou não é uma vergonha?

Vale lembrar também o que esse acordo pode representar para a população carente de Ilhéus, pelo fato de apenas 3 leitos serem conveniados com o SUS.

Até então, pelo fato de ser uma instituição filantrópica, essa limitação sempre foi deixada de lado na hora de optar que pode ou não pode estar internada naquela unidade. Estarei eu sendo mesmo um “espírito de corvo que vê podridão em tudo”?

Faço um desafio à direção da Santa Casa.

Convoque a Irmandade (se ela, de fato, existir) para uma reunião com a minha presença e participação. Que sejam chamados os irmãos escolhidos e aprovados pela Mesa Diretora da Irmandade, a partir de dezembro de 2010, na gestão do atual provedor, para discutirmos os caminhos da instituição.

Que junto a eles, a direção apresente o Livro de Ata especificando a formação atual da Irmandade. Este será, sem dúvida, um momento ímpar para debatermos a UTI e outros assuntos.

Como, por exemplo, o fato de, apesar de o Artigo 8, do Estatuto da Santa Casa, impedir que integrantes da diretoria mantenham com a instituição qualquer vínculo de emprego ou serviço, há pessoas, cuja esposa detém 98 por cento do controle acionário de uma clínica que funciona lá dentro, faturando com os serviços prestados.

A estas pessoas quero solicitar, além destas explicações, documentos que comprovem, pelo menos, que elas estão repassando 8 por cento do faturamento bruto para o próprio hospital, conforme prevê o contrato assinado entre as partes.

Podem marcar a data.

Eu vou.

Peço apenas que não seja no período de 25 a 30 deste mês, porque estarei em Fortaleza, participando da Semana Brasileira do Aparelho Digestivo. Mas pode ser qualquer outra data.

Quanto aos que me consideram “corvo” neste debate que sempre foi feito entre quatro paredes pelos servidores e trabalhadores da Santa Casa e que, agora, transformei em debate público, gostaria apenas de dizer uma coisa: o “corvo” que eles enxergam em mim apenas trabalha para impedir que prevaleçam as ações dos lobos que hoje agem silenciosamente em pele de cordeiros.

O autor é médico.